26 maio 2006

Este poema que vos deixo...

A torpe sociedade onde eu nasci
Ser doido, que maior ventura!
Morrer vivendo p’ra além da verdade.
É tão feliz quem goza tal loucura
Que nem na morte crê, que felicidade

Encara, rindo, a vida que o tortura,
Sem ver na esmola a falsa caridade,
Que bem no fundo é só vaidade pura,
Se acaso houver pureza na vaidade.

Já que não tenho, tal como preciso,
A felicidade que esse doido tem
De ver no purgatório o paraíso...

Direi, ao contemplar o seu sorriso,
Ai, quem me dera ser doido também
P’ra suportar melhor quem tem juizo

António Aleixo - in Este livro que vos deixo

O snobismo da sociedade actual

Domingo é dia da gente
Por isso quero ficar na cama
Dormir, dormir, dormir
E quando acordar quero ver Domingo da Gente porque todos o vêem e também sou gente!
Ontem era sábado. A minha amiga foi àquela festa com um vestido que deixou-me a pensar a noite toda.
Perguntei onde é que ela o comprou. Não ficou lá muito contente por ter feito tal pergunta mas acabou por me dizer onde comprou e quanto custou.
A minha mesada não dá para comprá-lo mas já comecei a fazer uma poupança para ver se ainda este mês consiga tê-lo. Mas tem que ser já! Se demoro, ou sai de moda ou torna vulgar. Por isso, agora sequer estou a comprar aquele chocolate que adoro, pa-m pode popa
Por causa daquela telenovela que está a passar agora na tv, toda a gente la na escola veste como ela que é toda poderosa. Hum, eu não gosto da maneira de vestir dela, mas as minhas amigas todas gostam, logo, não vou ficar de fora, né?

Ontem usei aquela expressão que agora está na moda e um meu colega perguntou-me aonde fui arranjar aquilo. Toda a turma riu-se do coitado. Realmente o palerma não está neste mundo. Já aconselhámo-lo a fazer uma reciclagem.

Pooooxa, quel carrão lá, pá. Quel e nha sonho!!! Nha pai, quel antiquado comprá um cosa d’one 60, já’m dzel que el tem que sintonizá. Ma el ê teimoso. Bo sabê manera que ques gente lá ê, nem?

Filho, não deves fazer isso! Ah, mãe, deixa-me em paz, todos fazem e eu é que não vou fazer??? esta na moda, mum!
Filha, porque não usas aquelas calças que te comprei no ano passado? Nãao, são bonitas, gostava delas, mas já não estão na moda
Mas, filha agora já não há outra palavra que não seja moda? Ah, mãe, moda está na moda, e o que ta na moda não se incomoda. E moda Djony que comprá quel skoda. Tud gente dez’l que el era fei ma el dez que skoda te na moda.
Agora la na quel salão es te estód te feze quel pentear de quel mnina daquel publicidade, poxa agora, pe consegui um vaga bo tem que marca’l que antecedência.

Pooxa, e-m escreve descuidod, gora que ja-m repara! Ah, nao faz mal ta na moda

12 maio 2006

(CLAN)DESTINO - casta de destino ê ess?

Faz agora um ano que as autoridades marítimas cabo-verdianas surpreendiam uma embarcação que tentava sair de forma clandestina do país com mais de sete dezenas de cidadãos à bordo. O Jon Cabafumo, o maldito barquinho, foi interceptado na zona de São Tomé, Praia rural. Tudo apontava que o destino era a Europa, servindo as Canárias como trampolin.
Uma vez interceptada, a embarcação foi encaminhada para o Porto da Praia. Sob escolta policial, os ocupantes foram desembarcados e encaminhados para a Esquadra Policial da Achada Santo António. Permaneceram dias no país, tendo alguns activistas dos direitos humanos levantado algumas questões sobre a forma como estariam a ser tratados. Depois o governo encarregou-se de devolver os emigrantes aos seus países de orígem, tendo para isso, alugado um navio.

Já este ano, no mês de Janeiro um barco de pesca com 237 passageiros clandestinos oeste-africanos que pretendiam viajar para a Europa foi interceptado pela Polícia cabo-verdiana nas imediações do Porto da Palmeira, na ilha do Sal. A embarcação, baptizada com o nome "Florence" matriculado no Senegal, esteve ancorado durante algum tempo do Porto de São Vicente para reparações. Depois de deixar aquela ilha, o barco passou pelo Sal, onde teria recolhido grande parte dos candidatos à emigração ilegal. Segundo relatos dos clandestinos às autoridades cabo-verdianas, cada um dos passageiros pagou entre mil e mil e 500 euros para serem transportados inicialmente para as ilhas Canárias, de onde seguiriam posteriormente para um país europeu. O desfecho foi trágico, já que um bote que transportava os passageiros da terra para o bordo do "Florence" ter-se-ia afundado com várias pessoas a bordo. Mais tarde alguns corpos viriam dar à costa.
Há cerca de dois meses, as autoridades marítimas nacionais recebem um alerta de que estaria uma embarcação à deriva nas águas de Cabo Verde. O N/M Matiota partiu da Boa vista em direcção à mesma e ao aproximar-se o cenário não poderia ser mais macabro: 12 cadáveres, já em estado de decomposição, jaziam numa pequena canoa. Entre dificuldades e impasses em torno do destino a darem aos achados, a canoa acabaria por desaparecer no imenso horizonte do Oceano Atlântico.

Na semana passada, mais um caso: desta vez, vindo do largo da ilha Brava, as autoridades marítimas recebem um SOS de um barco que estaria com uma avaria. Partem em direcção ao barco, regatem-no e mais tarde descobrem que, para além da tripulação, havia mais de cinco dezenas de emigrantes clandestinos fechados no porão do pesqueiro.
Agora, lá estão os pobres desgraçados atracados no porto da Praia, à bordo do navio, a espera de um repatriamento. A Cruz Vermelha de Cabo Verde vai assegurando-lhes uma refeição por dia, até o momento de zarparem as águas rumo aos seus destinos, de onde querem a todo custo fugir.
Ainda nessa semana, agora na ilha do sal, cidadãos da nossa costa africana roubam um barco de recreio na Baía de Santa Maria, após terem forçado o único ocupante a lançar-se ao mar mediante ameaça com arma branca. (In)felizmente os desafortunados encalham na zona de Ponta Preta e a polícia consegue capturar alguns desses "raptores marinhos". O barco em questão pertence ao Oscar Duarte, antigo selecçionador nacional de futebol, que veio dizer que há muito que vinha sendo abordado por um cidadão que queria comprar o barco. Duarte assegura que não o fez por desconfiar que o comprador poderia estar elvolvido em tráfico humano.
Lia este fim de semana no "Olhares" de Marilene Pereira, a questão da emigração clandestina que, no olhar da jornalista, poderá intensificar em direcção à Cabo Verde em virtude das políticas cada vez mais cerradas na Europa, com vista a combater este flagelo. Estaremos preparados?
Ahh, ontem ouvi pla radio que um semanário sueco anunciou que a tal canoa que desapareceu das águas de Cabo Verde, após ter aparecido vindo não se sabe de onde, teria dado à costa nos Barbados.