13 dezembro 2008

Reencontro

O Natal está à porta. Eu vou p'ro meu Sintadez, estou ansioso! Este ano a ilha virou uma autêntica "Europinha". Os meses de setembro e, sobretudo, outubro bafejaram a ilha com muita chuva. "Dizem que o campo se cobriu de verde, da cor mais linda que é a cor da esperança". Quero ver e sentir o bafo da terra-minha. Quero recordar Cabral e acreditar em Nunes: "sonho que um dia..."
Enfim, apetece-me dizer que vou para o meu planetinha, o meu planetinha verde, que tanto estimo!
Pedra em Estritin
(foto: BCN)

27 novembro 2008

Corvo

Gosto muito deste lugarejo. É uma das muitas zonas encravadas do concelho da Ribeira Grande. Os carros não chegam lá, mas há telefone e energia eléctrica 24 horas por dia. Corvo sofre muito com o êxodo rural e hoje o lugar é maioritariamente habitado por pessoas velhas ou de meia idade. A maioria dos nativos migraram-se principalmente para Ponta do Sol, que é a vila mais próxima.
Mas Corvo é um esconderijo que proporciona ao visitante momentos únicos: na comunidade pratica-se agricultura de regadio (cultivo de inhame, cana de açúcar, banana...) e de sequeiro (milho, feijões...). Há um vale bem estreito e mais ou menos comprido que se penetra pelas montanhas adentro; há água límpida a correr pela ribeira onde ainda se pode encontrar agriões e hortelãs; há patos a nadarem nos pequenos pântanos... e o mar está há poucas centenas de metros.
Tirando a falta de estrada, corvo tem de tudo um pouco, é um encanto! O próprio trajecto, em caminho vicinal, acaba por ser um prazer: as dezenas de curvas em declive, a fresca brisa que vem do mar que fica lá em baixo, a vista panorâmica sobre o oceano, enfim... belezas escondidas da minha ilha!

foto: fonte aqui

15 novembro 2008

"BAGDAD" paralisado

Esta notícia fez-me recuar alguns anitos (cerca de seis) e recordar a altura em que percorríamos diariamente a pé o trajecto Ribeira da Torre - Vila da Ribeira Grande, para assitir às aulas no liceu Suzete Delgado. Bem, no meu caso, nem eram grandes distâncias. Da minha Ribeirinha de Jorge até ao centro da vila são menos de 3 kilómetros, percurso esse que fazíamos em 25/30 minutos. Mas tinha colegas de turma que, por morarem mais acima, galgavam a pé cerca de 5 ou mais kilómetros até chegarem ao liceu.

Ainda não havia autocarros e estávamos tão acostumados! A nossa maior inimiga era, sem dúvidas, a fumaça levantada pelos carros e pelas esporádicas ventanias. Éramos obrigados a lavar o nosso uniforme duas ou três vezes por semana, porque senão, a gola que era verde-clara ficava castanha. Mas não era só a roupa. Os nossos sapatos também sofriam. As solas gastavam-se facilmente e, (in)felizmente, ainda as lojas chinesas eram insignificantes.
À entrada da vila, lá na K'Beça de Vaca como diz minha avó, montávamos uma autêntica estação de lavagem e recauchutagem das nossas "rodas", para que elas não parecessem castanhas em vez de pretas.
Bem, hoje há viaturas de aluguer a cobrar 20, 30, 50 escudos, conforme a distância, para quem quiser e tiver possibilidades de ir de carro. Há também o autocarro escolar para aqueles que moram um pouco mais distante - o "Bagdad" - conforme os rapazes trocistas do vale o apelidaram por causa da sua cor que mais parece uma máquina das Forças Armadas. Neste momento está parado por causa das péssimas condições da "estrada" de penetração do vale. A "estrada" que corre para o mar sempre que uma chuvinha mais intensa origina um ribeiro.
Fotos: asemanaonline

13 novembro 2008

No (vo)AR

Um aeroporto é uma necessidade para a ilha de Santo Antão”(...) Esse aeroporto tanto pode ser em Porto Novo como em qualquer dos outros municípios da ilha. O fundamental é que ele seja construído”
Amadeu Cruz, Presidente CM Porto Novo, in Liberal

08 novembro 2008

"Grétas" da minha ilha




Aprecio muito, muito mesmo, a mão de obra dos antigos anónimos da minha ilha: Aqueles que, como costumo dizer, não tiveram (nem terão) direito a bustos nem covas compradas nos cemitérios.

Fotos: BCN

03 novembro 2008

A magia do Bana no Auditório Nacional

Afinal, o talentoso é também um busód
Quem há alguns meses lia as notícias sobre o estado de saúde do Bana em Lisboa, certamente não pensou que, hoje, passado pouco tempo, o artista pudesse estar de volta aos palcos com tanto fulgor, talento e, acima de tudo, boa disposição.
Pois é, o Auditório Nacional Jorge Barbosa, na Praia, recebeu ontem um memorável concerto. Bana, ao seu grande estilo, empolgou uma assistência que ao longo de mais de uma hora aplaudiu sem parar este colosso da nossa música.
Era a primeira vez que assistia a um concerto desse gigante da música nacional, ao vivo. Um grande privilégio!

Cantar é, sem dúvida, aquilo que melhor sabe o GIGANTE fazer. Isso não constitui novidade para ninguém. Só não sabia que, para além de encantar a cantar, Bana encanta com a sua forma de estar no palco. Ontem ele revelou ser uma pessoa muito comunicativa e bastante busód. Com um sentido de humor apurado, Bana fazia o público soltar umas boas gargalhadas cada vez que a ele se dirigisse.

O ínício foi emocionante: entrou no palco a interpretar a eterna "Lena" e quando terminou, pediu desculpas por "ca ter cumprimentód antes". De seguida lembrou os momentos difíceis por que passara meses antes e agradeceu "aos médicos, ao povo cabo-verdiano e ao governo de Cabo Verde." Por essa altura, comovido, quase deixou verter algumas lágrimas. O público aplaudiu com emoção e Bana retribuiu com mais uma morna imortal.

Numa noite de grandes mornas e coladeiras, Bana recebeu o carinho de um público maravilhoso que cantava junto com o mestre, apaludia sempre e, de vez em quando, uma ou outra voz se ecoava no meio da noite a pronunciar frases de admiração e estima. Por exemplo, a uma dada altura, na ligação de uma música a outra Bana, ao expressar algumas palavras, fez umas reticências "mim é.... ". Logo um grito soltou "... bo é um Património". Bana completou "é verdade, um património."

Mas foram muitos os momentos sublimes (aliás assim foi todo o concerto). Eis mais alguns momentos que resgitámos:
  • Na morna Lora Bana chamou uma jovem e fizeram dueto. A menina foi corajosa, mas passou no teste;
  • Na coladeira mexê mexê Bana esboçou um pé de dança e o auditório entrou em delírio. Que ovação!;

  • Antes de interpretar Maria Bárbara Bana dedicou essa morna a uma criança desconhecida que através de um terceiro lhe tinha enviado um recado: "iria ao concerto só para o ouvir cantar Maria Bárbara";

  • Na parte final, Bana diz: "ja'm ti te bem dá más só 2 muzca: um é pa cabá, ot é pa consolá"(...) e'm tem 5 minuto pa'm pensá que música ti te bem ftchá bsot ess not". Esta foi mais uma tirada de humor que deixou a plateia dodu;

  • E para acabar mesmo, Bana despediu desta forma: "bsot é maravilhoso, bsot é estrondoso... mas... mim também e'm ca ta fcá pa trás"

Enfim... momentos desses são raros neste país de música. Está de parabéns quem teve a ideia de voltar a trazer o Grande para o Auditório, desta vez não para interpretar apenas 4 músicas, felizmente. O concerto de ontem mostrou que o público, seja ele da Praia, de Soncnet, Sintanton, Fogo, Brava... está sedente de mais eventos culturais.

Parece que o Auditório Nacional - até bem pouco tempo tido como um autêntico Elefante Branco, começa a ganhar alguns pigmentos diferentes... digamos mais naturais. Que venham agora outros artistas: Cesária Évora, Tito Paris e a sua Orquestra (o tal sonho), Tcheca, Princezito, Teatro, dança... pelo menos tud fim-de-seman um evento, hehehehe (sonhar é bom)

Hah, em jeito de basofaria: a última música da noite, a tal consolança, foi Fitche Fatche na Tracolança. Música que relata um "fitche fatche" na Ponta do Sol, vila sintadezense.

25 outubro 2008

A propósito de Santo Antão Património Nacional

Sinta10, como é óbvio, não poderia ficar indiferente a este post. Pode ser que tenha sido realmente um delírio. É que vem de uma Ala que está muito à margem, logo dá para desconfiar. Mas, de todo o modo... vou embarcar também neste "delírio".
Os caboverdianos, por "amor à terra" deveriam procurar conhecer melhor esta parcela do seu território. Conhecer a fundo os seus atractivos naturais, os seus costumes, as suas tradições, enfim... procurar mergulhar um pouco mais no seu quotidiano mais profundo (sem esteriótipos, sem PRÉ-conceitos)

Santo Antão é...
  • riqueza;
  • encanto;
  • um Património Nacional, logo... um DELÍRIO
    Pena que eu seja um suspeito, mas ...
Fotografia: fonte aqui (desfrute!)

22 outubro 2008

Levá ma trêzê

As últimas cheias em Santo Antão não só levaram muita coisa para o mar, como também trouxeram outras para a ribalta. Que o diga a população da vila da Ribeira Grande que está agora a sofrer com os efeitos do cheiro de "derivados de óleos queimados e gasóleo", vindos à superfície depois das enxurradas de 6 e 7 de Outubro.

O facto está a desencadear uma interessante discussão aqui.
De repente, a população se desperta para o problema da poluição ambiental que há anos afecta o concelho. O caso da lixeira em Barbasco é, talvez, o caso mais gritante, com a população de Monte Joana e zonas limítrofes a inalarem o fumo que diariamente sai dessa ligeira rumo ao planalto. Estas cheias podem ter dado o mote para que venham a aparecer soluções para os problemas de poluição no concelho. Sobre a localização da central electrica, há muito que se fala no projecto da central única. Quanto à lixeira...

20 outubro 2008

Sete Sóis Sete Luas

A versão cabo-verdiana do festival Sete Sóis, Sete Luas, que acontece anualmente na Vila da Ribeira Grande, já tem data marcada. 14 e 15 de Novembro são os dias em que Puvoçon vai estar movimentada com artistas cabo-verdianos, portugueses e italianos. Segundo a Inforpress já estão confirmados as presenças do grupo português "Navegantes" e do italiano "Terra Mata". A organização - CMRG - promete melhorias para este ano e já tem programado como uma das actividades paralelas "uma acção de formação destinada aos estudantes que frequentam as escolas do ensino secundário no concelho da Ribeira Grande."
Como as actividades culturais na vila não abundam (aliás são mesmo raras) Sinta10 espera que a população da ilha venha a desfrutar do certame e que os sóis e as luas das sete partidas iluminem a vila durante esses dois dias.

Por falar em escassês de actividades culturais, agora lembrei-me que o Festival Nacional de Violino, que se pretende(ia) institucionalizar no concelho, não se realizou este ano. Ahh, sim... foi por causa da campanha! Em ano elitoral as baterias apontam para uma única direcção, pelo menos por cá. Enfim!!!

Hipótese

O ceu da minha ilha é estreito e tem montanhas. Será por isso que por lá (já) não passam aviões?!!!
Foto: Estritin (BCN)

12 outubro 2008

E tudo Outubro levou

Recebi um e-mail com fotos das últimas chuvas caídas no dia 5 de Outubro em Santo Antão. Não sei quem as fez mas publico-as neste espaço.

Há quem diga que chuva igual em Santo Antão há mais de 30 anos não se via. De uns anos para cá o mês de Outubro tem sido pródigo em matéria de escorroço na ilha. Este ano as comportas abriram com veemência, o presidente da República interrompeu a visita que havia começado pela ilha; as festas de Nossa Senhora do Rosário tiveram que ser adiadas; as barracas já montadas foram-se por água abaixo. Abaixo também foram as obras das duas pontes sobre as ribeiras que circundam a vila, pontes que irão ligar Povoação à Ponta do Sol e Paul.
Muitos, sobretudo aqueles sem estudo nem canudo mas com experiência adquirida na escola da vida, já tinham previsto esta situação. Custaria esperar o dito mês de escorroço passsar para só depois começar as escavações? E lá se foram alguns troquitos (preciosos porque raros por aquelas bandas)


04 outubro 2008

Um património com nome de boi, mas... sem força

Depois da tempestade...
Bem não sei se digo que vem a bonança. Prefiro apenas pensar que a Meteorologia esteja a prever dias menos zióg.
Não estou a falar de furacões, daqueles que nos chegam, felizmente só pela televisão, e vezes sem conta arrasam sobretudo países das Caraíbas e costa dos Estados Unidos. Refiro-me à tempestade de insensilidade que tem afectado o Farol Fontes Pereira de Melo, vulgo Farol de Boi, sito no Nordeste de Santo Antão. Costumo ser um indivíduo um bocado céptico, ou então um espécie de São Tomé que para crer precisa de ver, com os seus (próprios) olhos, naturalmente!
Por isso mantive sem euforias quando, na semana passada, via e ouvia o ministro das Infraestruturas e Transportes, Manuel Inocêncio, a anunciar na TCV que já existe, ou vão conceber (já não me recordo) um projecto para recuperar o já tão definhado Farol de Boi. E para dar corpo ao meu cepticismo fui revolver os meus arquivos e reler um apontamento sobre esse farol, da autoria de Rosendo Pires Ferreira, publicado na antiga revista Ekhos do Paul, ediçao nº 2, segundo trimestre de 1992.
O autor começa por fazer uma breve incursão pela história e escreve que o farol “foi mandado construir por Portaria Régia de 2 de Abril de 1884, para indicar a entrada do canal de Sao Vicente pelo Norte, iniciou a sua actividade a 15 de Maio de 1886, conforme AVISO DOS NAVEGANTES publicado no Boletim Oficial n17, de 17 de Abril desse longinquo ano”.

Note-se que em 1992, altura em que foi produzido o artigo, o farol já completava 106 anos de “ininterrupto funcionamento”, facto, aliás, assinalado pelo articulista.


O artigo prosegue a indicar o papel de “importância transcendente” que o farol “desempenhou na rota dos navios que cruzavam o Atlântico medio e particularmente nas rotas dos Sul e para as Américas”; lança um olhar sobre as características que fazem do Farol de Boi um “bem histórico-patrimonial” para, já na parte final, abordar o futuro dessa magnífica obra.
Ah, pois... é aqui onde eu queria chegar! Segundo Pires Ferreira, em Novembro de 1991, a AMIPAUL, em carta dirigida ao então Ministro da Educação, que também na altura tutelava a pasta da Cultura (...) “chamou a atenção do governo para esse Património Histórico Nacional (...) e solicitou o reconhecimento formal dessa qualidade”. Entretanto, fazia notar o autor, “mais de seis meses depois (...) nenhuma reacção oficial foi tornada pública a esse respeito”
Posteriormente, ao que parece, soube-se que a então Direcção-Geral da Marinha Mercante teria a pretensão de “transformara essas instalações num museu”, ideia que seria prontamente acarinhada pela AMIPAUL conforme faz notar Ferreira ao escrever que aquela Associação declarava “apoiar sem reservas a ideia”, ou então que “ela [a AMIPAUL] se prontificou a dar o seu apoio na busca de fontes de financiamento para a concretização dessa ideia.”
Vejamos: passam hoje 16 anos após este texto ter sido escrito e a situação mentém-se inalterável. Ou seja, nada foi feito para recuperar/preservar essa construção centenária e hoje o monumento está a cair de podre. O máximo que conseguiu foi ver as lentes da sua lanterna desactivadas e substituídas por modernas lentes à energia solar, instaladas ali mesmo nas imediações.
A última vez que lá estive foi em Agosto de 2007 e era triste constatar que já não se pode, com firmeza, subir as escadas metálicas da torre do farol porque há o perigo de haver uma derrocada. Igualmente triste é ver o estado em que se encontra a casa dos faroleiros, edifício contíguo ao farol, outrora com 8 divisões, hoje quase que não tem paredes interiores, nem cobertura.

Por tudo isso, tenho todos os motivos para manter a minha atitude céptica e esperar até o dia em que meus olhos me forçarem a acreditar que alguma coisa foi feita para recuperar o farol (se esse dia vier). Mas... há agora uma réstia de esperança e esta quem ma traz é a estrada Porto Novo / Janela que passa bem pertinho do farol. Aliás, foi na sequência de uma visita às obras dessa estrada que o ministro Manuel Inocêncio falou na intenção de se vir a fazer alguma coisa para recuperar o que ainda pode sobreviver do farol.
E todos sabem que, rentabilizando aquele espaço, pode-se aproveitar aquela fantástica vista que se tem sobre toda a costa Norte de Santo Antão, com o ilhéu dos Bois logo ali no sopé. (logo aqui ao lado, também)

Características gerais do Farol
Nome:
Farol Fontes Pereira de Melo
Localização: Pontinha de Janela, Noerdeste Santo Antão
Início Construção: 1884 (começou a funcionar em 15/05/1886
Torre: 10,7 m
Lanterna: 4,5 m, assente numa base metálica com 3 m de diâmetro
Alcance: 27 milhas

Fonte: FERREIRA, R.P, in Ekhos do Paul, Abril/Mai/Jun, pp 36,37,38

Há dois anos escrevia aqui o meu primeiro post sobre o farol. E se daqui há dois anos tivesse que publicar outro post a dar conta das obras de recuperaçã0?!! Mas prefiro deixar accionado o meu desconfiómetro até meus olhos ordenarem o contrário.

02 outubro 2008

Vultos da Ilha

João Morais

Hoje, 2/10, completa o primeiro centenário do nascimento de João Baptista de Morais, mais um ilustre filho de Santo Antão. Para assinalar a efeméride a Direcção do Hospita Regional da ilha, que ostenta o nome desse grande médico, organiza hoje alguns eventos para relembrar o seu patrono. De entre as actividades destaca-se a apresentação do livro "Memórias de João Morais", por Pires Ferreia.

Mas, quem foi João Morais? Eis alguns dados bibliográficos:

"João Morais nasceu a 2 de Outubro de 1908, no Paul. Fez os estudos secundários no Liceu Infante D. Henrique, no Mindelo, formou-se em medicina na Universidade de Coimbra, em 1936, e fez ainda os cursos de Medicina Tropical em Lisboa (1937), de Medicina Sanitária em Coimbra (1941) e o curso de Malariologia (1955), como bolseiro da OMS, nos Camarões.
Trabalhou nas ilhas de Santo Antão, Santiago, Sal e São Vicente, foi professor de liceu, juiz substituto do tribunal de Sotavento, Vice-presidente da Câmara Municipal da Praia, e na vida associativa foi sócio da Associação Académica de Coimbra, presidente da Comissão Administrativa da Rádio Clube de Cabo Verde e depois do Grémio Recreativo do Mindelo.

JM Faleceu a 26 de Outubro de 1995 na cidade do Mindelo e nesse mesmo mês foi atribuído o seu nome (Dr. João Morais) ao Hospital da Vila da Ribeira Grande, inaugurado poucos dias depois da sua morte."

Fonte: Inforpress

29 setembro 2008

100º Post

Este é o post nº 100 do Sinta10. Há cerca de dois meses de completar 3 anos, uma centena de postagens não constitui, certamente, motivo de celebrações. Com um ritmo bastante irregular e descomprometido, este canto vai esgrovetando como pode a sua ilha querida. Uma missão que, decididamente, não pensamos abandonar tão cedo, pese embora algumas hibernações sazonais.

17 setembro 2008

Estritin

Esta é mais uma das maravilhas escondidas de Santo Antão.
O nome do recanto é Estritin (vamos traduzí-lo por Estreitinho). Fica situado nos confins da ribeira de Caibros, vale da Ribeira Grande. Depois de passar pelo povoado, infiltra-se pela ribeira adentro e ao fim de uns 20 minutos a subir... huf! que maravilha! Uma linda cascata, ladeada por montanhas que atingem o céu. A água da cascata é fresquinha e cristalina. Não se pode resistir e um mergulho torna-se imperativo. Mas as maravilhas são tantas! Mesmo ao lado da cascata, do lado esquerdo nasce uma outra água, esta totalmente diferente: de coloração alaranjada (férrea), deixa por onde passa um rasto multicolor. Nas grutas por onde escorre forma-se espantosos estalactites e estalagmites. Ao alcançar este esconderijo a adrenalina fica em alta. Um misto de encanto e medo invade o visitante que se assusta com o autoritarismo das rochas a nos escoltar com um olhar medonho de cima para baixo.
Uma descoberta verdadeiramente arrojada (ou o local não se chamasse Estritin e fosse mesmo inrrojód). Mais palavras p'ra quê? As imagens são soberanas.











Fotos: BCN

12 setembro 2008

O vale, a chuva e o verde

... e porque será que o cabo-verdiano anseia tanto pela chuva? A minha Ribeira da Torre, que neste momento bem se poderia chamar Ribeira d'Água, já é tão linda sem chuva, ki fari go...


Fotos: BCN

10 setembro 2008

O vale, o verde e a (falta de) estrada (II)

Para não variar, o meu vale voltou a ficar isolado. A chuva fez correr muita água e a indefesa estrada (?) de terra batida correu para o mar. Mas desta vez a vítima não foi apenas a rodovia. Árvores desabaram em cima dos cabos de electricidade e o vale ficou dias sem energia. Agora, dizem, o vale vai ter estrada asfaltada, uma espécie de cobra negra, como diz o Paulino, a desfilar lânguida por entre margens e encostas verdejantes do vale.
Realmente é algo estranho, ver uma cobra, ainda por cima pretona, a deambular pelo vale adentro. Cobras que, a existirem pelas bandas, só se forem minhocas ne tchon de bananeira.
Para complementar (re)leia este post

Linda

Acabo de regressar da ilha. A chuva disse lovód nome Déus, os campos estão pintados de verde, a terra tem agora outra cheiro e outra pinta. Vi cascatas, cachoeiras, aga na rbêra. Ah, minha ilha é linda, lindíssima. Sintanton, como te quero! quero-te tanto... assim como o Abrão quer Santiago! Ahhh, e és linda, muito linda, lindíssima.

01 agosto 2008

Casta de cosa ê ess?

Acabo de ouvir isso na RCV, num despacho do jornalista Marco Rocha:
Duas cabo-verdianas em Portugal foram proíbidas, pela Junta de Freguesia de Benfica, arredores de Lisboa, de falarem crioulo no seu local de trabalho, por "perturbarem os colegas que nada entendem".
A medida foi prontamente contestada pelas visadas e pela Associação SOS Racismo que acham ser uma atitude xenófoba. A uma dessas meninas, inclusivê, já foi instaurado um processo disciplinar.
O autarca em causa contrapõe "argumentando" que já recebeu cerca de 5 queixas de colegas que nada entendem e, perturbadas, desconfiam que as moças possam estar a falar delas. Por isso, "a medida APENAS visa salvaguardar o bom ambiente no trabalho".
E se as moças estivessem a falar inglês? chinês, alemão???!!!!
Ulalá, já começo a ficar receoso: É que por cá, no meu trabalho, sempre que'm te ratchá nhe criol escferruntchent de Sintonton, muitos dizem não me entender. Estarei a perturbar alguém?!! Estou preocupado. (ah, qui nada moço, descansá, bo te ne bo terra)

Ponta do Sol, Pescadores e Cavala

Começa a vigorar a partir de hoje até 30 de Setembro próximo no país o período de defeso para a cavala preta. A medida faz parte de um conjunto de acções tendo em vista a “conservação e exploração racional dos recursos haliêuticos, em prol do desenvolvimento sutentável do sector das pescas”.
Apesar da medida pertencer a um pacote aprovado em 2005, portanto há já 3 anos, parece que muitos ainda não se consciencializaram do quanto é importante e necessário que haja um período interdito à pesca de certas espécies, quanto mais não seja para que as mesmas possam reproduzir-se “em paz” e garantir assim a continuidade da espécie.

É certo que qualquer medida restritiva do género tende a chocar com intereses económicos, sobretudo quando se trata das comunidades piscatórias que muitas vezes têm poucas alternativas de sobrevivência. No entanto, vista numa lógica de medio ou longo prazo, apercebe-se da utilidade de tais medidas.

A cavala é uma espécie bastante comum nos mares de Cabo Verde e, segundo o INDP, o cerco a essa espécie é ainda bastante expressivo nas comunidades de São Pedro (São Vicente), Palmeira (Sal) e Ponta do Sol (Santo Antão).
Ah, sim, Ponta do Sol! Falar de Ponta do Sol implica falar de pesca, implica falar, já agora, de cavala. Na região Norte da ilha não existem muitos ancoradouros de botes pelo que se pode dizer que a vila da Ponta de Sol se afigura como um grande bastião de pesca dessa região e, quiçá, de Santo Antão. Na vizinha vila da Ribeira Grande, não se pesca, pese embora situar-se a beira-mar. A propósito, abro um parentesis: há alguns anos, por altura do festival Sete Sóis Sete Luas, estava Tito Paris em palco, quando dedicou a música mar d’ilhéu “a todos os pecadores desta vila" (Ribeira Grande). E aqueles que estavam mais perto do palco gritaram em uníssono, ei e’n den pescador. O artista, apesar de parecer incrédulo, teve que reformular a dedicatória.

Mas voltando à vaca fria: é facil adivinhar o apuro dos pescadores da Ponta do Sol, neste período em que é proíbida a pesca da cavala. Arrisco mesmo a dizer, eu que não sou do litoral, que falar em pescado na Boca de Pistola (foto) quase que implica falar de cavala, caso contrário, hoje mar e’n dá pêxe. Mas a entrada hoje em vigor da medida, como sempre, não deixou os pescadores solpontenses indiferentes. Segundo o nosso HF, os mesmos estão chatiados porque a medida lhes apanhou de surpresa e reclamam porque deviam ser avisados com antecedência. (!!!???)

De qualquer forma todos devem empenhar-se no sentido de garantir o defeso dessa e outras espécies durante o período estipulado. Só assim poderemos garantir melhores dias para as gerações vindouras. Se medidas do tipo tivessem sido tomadas no passado em relação a outras espécies, talvez eu e meus colegas ainda tivéssemos conhecido na ilha esta espécie, por exemplo.
Saudosismos a parte, resta-nos desejar boas férias à cavala.

Obs: A cavala é tão popular pelas bandas da Ponta do Sol e zonas limítrofes que um dia nha Lurdes, lá de Selada, mandou o criado Ivanildo (moço lá de Ribeirinha Curta) ir comprar peixe no carro que vinha buzinando. Ivanildo chegou na viatura e ficou indeciso porque não viu “peixe”. Lá acabou por fazer a compra e regressando à casa rematou: "Nha Lourdes, mi’n otchá pêxe ma e’m trezê cavala”

19 julho 2008

Burro na grelha

O burro sempre fez parte do quotidiano do camponês caboverdiano. De uma utilidade extrema, este animal revelou ser, ao longo dos tempos, um grande aliado dos habitantes das ilhas mais rurais de Cabo Verde, sobretudo como meio de trasnporte (de cargas como pasto, géneros alimentícios, cimento, areia, água, pessoas etc.)

Para se ter ideia da importância do elmara, há alguns anos este animal foi alvo de uma das propostas mais inusitadas vindas da classe política nacional. Um aspirante a autarquia da Boa Vista falou na possibilidade de exportar burro da Ilha das Dunas para outras paragens (Europa? América?)

Agora, os tempos são outros... a conjuntura é outra. Tud cosa já sbi, transportá gente ta cór, quanto mais burro. Mas não é que a proposta do então candidato pode vir a ganhar sentido. Já que burro agora ti ta bai pa grelha, quem sabe venha a surgir outras ideias, digamos mais requintadas, tipo: exportar burro... ENLATADO.

Este bla blá "asnento", diga-se, me ocorreu a propósito de um post de uma cabrera. A não perder Confira aqui.

18 julho 2008

Vultos da ilha

Luis Romano
Nasceu a 10 de Junho de 1922, em Santo Antão. Estudou em São Vicente e trabalhou na sua juventude nas ilhas de São Nicolau e sal. Foi da sua vivência nestas ilhas, nos anos de fome e Fascismo, que se inspirou para escrever o célebre romance Famintos, publicado no início dos anos 60.

Coincidentemente, Luis Romano e Januário Leite nasceram no mesmo dia - 10 de Junho (dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas)
Luis Romano ainda é vivo e reside em Natal, Brasil, desde 1962.

Símbolo
O formato daquele berço foi um símbolo
O menino em miragens impossíveis
dormia sonhando com navios de papel
enquanto eu contemplava
a cismar,
o conjunto daquela harmonia
sumindo-se na linha do mar.

Navio-berço de menino crioulo
navio-guia que ficou sem ir"
navio idêntico ao navio da nossa derrota parada".

(Luis Romano, Clima, 1963)

04 julho 2008

Queijo

Ao referir, no post anterior, à "casca" de queijo lembrei-me das farras que fazíamos na ilha: queijo com pão, comprado lá na casa de Nha Guida. As quartas-feiras aguardávamos ansiosos a chegada da senhora que ia à Lagoa abastecer de queijo fresquinho para depois comprarmos a 120 escudos unidade.

Hoje o cenário está mais complicado. Chuva escasseia-se, pasto nada, queijo nem vê-lo, ou se há, o preço dispara. O cenário é tão desolador que a fábrica de queijo de Porto Novo teve mesmo que interromper a actividade, como se relata aqui.
Ontem a chuva falou mantenha. Oxalá seja o prenúncio de um bom ano agrícola para que possamos ter pasto à-vontade e queijo inguêrrnel, quanto mais não seja para não voltarmos a contar estórias como esta.

03 julho 2008

VIVA QUEL VIM (Memórias de escola primária)

Retomando aqui as memórias que vieram à tona através dos comentários de alguns leitores (Mnininha de Puvoçon, Boltchor, Vera...) sobre o saudoso "viva quel vim"... ´

Era a meta que todos auguravam alcançar: transitar de classe para poder integrar a comitiva que no dia x sairia de porta em porta à cata de quel bolo, quel pipoca, quel torresma. Por isso era imperativo estudar e aprender a lição porque, caso contrário, bo'n dava passá, logo bo'n dav dá viva, logo bo tava fcá sem quel fétin novo.
O empenho era (quase) total. Todos queriam estar na mesa do exame a encarar os dois professores. E aqueles que fossem "cabeça dura" eram-lhes pedidido que sentassem em casa semanas antes do exame (coitados, ficavam retidos no crivo da sebatina: tabuada (8 X 7 = ???), gramática, Meio Físico e Social...
Aqueles que ficassem "apurados" morriam de ansiedade e a conversa era outra: quem que ti te bé inzemnób? É Dona Joana. uhau, ela é ménsinha! E'n ne nada, é senhor Antão, onhémén, el é mau!

No dia do exame: cólê texto que bo dá? mim e'm escolhê "A chuva amiga" e bo? Mim foi professora que escolhe'm nhe texto, e'm dá "Maravilhas do Mar. E bô? mim e'm escolhê "O cabritinho Obediente". Uahh, quel texto lá é sébim, mim e'm te elel etê de cor: (...) conta-se que um dia a mamâ cabra antes de sair da casa disse ao cabritinho: - fecha a porta com a tranca e não abra a ninguém!
Djon, cuitód, ele reprová ne mesa de exame. Quel lá gora é triste.

Ninguém queria ter, em Julho, um desfecho tão trágico. Por isso, a preparação começava desde Outubro do ano anterior e todos os detalhes eram levados em conta. Outros, desconfiados e supersticiosos, apostavam em plantinhas com tendências visionárias: pegavam nas folhinhas de uma planta, que agora me escapa o nome, e colocavam no meio do caderno. Se esta murchasse, hum, mau sinal! Mas, se ao contrário, permanecesse viva, hey... bons ventos.!!
Mas também era expressamente proíbido comer "casca" de queixo porque, de um potencial triunfador, poderíamos ir para o banco dos "cabeça dura". Afinal, as vitórias conquistam-se com muito trabalho e as vezes um pormenor é importante, hehehe. Não fôssemos transformar no fim do ano numa "raposa" devido a uma simples manhenteza como uma raspa de queijo, Deus defendê!

Tive a sorte de Dá viva ao longo dos quatro anos de escola primária. Assim que terminei a 4ª classe, em 1994, extinguiu-se, com a Reforma, o Viva quel vim. E morreu parte do encanto que envolvia todo o ensino primário. E nunca mais se ouviu cantar: manzinha dzê, quem fcá roposa, ali ca ta entrá! purrli? purrlá, 4ª classe ca brincadêra.

30 junho 2008

Vultos da Ilha

Sinta10 começa hoje uma nova rubrica que pretende (apenas) lembrar os grandes homens que se brotaram da ilha. Este primeiro post é dedicado ao poeta Januário Leite (este nome foi muito evocado nas últimas semanas por causa do caso que se estoirou no liceu que tem seu nome). Mas aqui a nossa música é outra. E a escola também... já agora!

Escola à antiga (soneto de Januário Leite)

Os óculos no nariz, bem cimentado
por densa massa de rapé imundo,
o rosto ora boçal, ora jocundo,
de tímidas crianças rodeado,

antigo professor está sentado
no meio dum silêncio o mais profundo,
solene aspecto - de aterrar o mundo,
pesada palmatória sempre ao lado.

A lição é de história. Já casmurro,
o mestre puxa a caixa de rapé.
O aluno lê: Dom Pedro quinto...um murro!

A tosca mesa abala!...o aluno em pé
encara o mestre...Que disseste, burro?
D...Pedro... V!...- D. Pedro V é que é!...

Januário Leite nasceu na Vila da Pombas, Paul, a 10 de Junho de 1867. O destino quis que morresse exactamente no dia do seu aniversários, isto é, a 10 de Junho de 1930. Autoditacta, esse grande poeta foi também, por algum tempo, professor primário e faroleiro em São Vicente.